"O ser humano é cego para os próprios defeitos. Jamais um vilão do cinema mudo proclamou-se vilão. Nem o idiota se diz idiota. Os defeitos existem dentro de nós, ativos e militantes, mas inconfessos. Nunca vi um sujeito vir à boca de cena e anunciar, de testa erguida: - ' Senhoras e senhores, eu sou um canalha'"

Nelson Rodrigues

Plural de Qliphah, cujo significado dado pelos cabalistas judeus é "Mulher Indecente". Cada sephirah possui um fator de equilíbrio dinâmico cujos aspectos são desagradáveis ao ser humano. Representam os conteúdos indesejáveis da nossa personalidade constantemente renegados pelo ego. Inegavelmente no caminho da evolução espiritual, tais características são confrontadas pelo iniciado, onde o segredo reside na união com os mesmos ao invés da supressão como recomendado por incautas filosofias religiosas do velho æon. Também possui o significado de desorientação espiritual.

Kenneth Grant possui um expressivo estudo sobre essas características espirituais, com destaque para sua aluna Linda Falorio e marido Fred Folwer. Na década de 80 ambos desenvolveram o conceito do Tarô das Sombras (Shadow Taroth) baseados no Liber CCXXI e na segunda parte do livro de Grant Nightside of Eden. Vasculharam os Túneis de Set, "uma rede de células oníricas no subconsciente humano" e montaram 22 pranchas desses " buracos-de-verme interdimensionais que arruinam a prosaica realidade do Lado Luminoso" através da projeção da consciência via Daäth, "o portal da manifestação e não-manifestação".

Também são chamadas "conchas".

QLIPHOTH

1. Nas outras esferas, fizemos referência às Qliphoth, as Sephiroth malignas a adversas; é hora, portanto, de estudá-las em detalhe, embora elas sejam "forças terríveis, havendo perigo até mesmo em pensar nelas". 2. Poder-se-á perguntar então por quê, sendo essas formas tão perigosas, será preciso estudá-las. Não seria melhor desviar a mente a impedir que as imagens de tais forças se formem na consciência? Em resposta a essa quetão, podemos citar os preceitos de Abramelin, O Mago, cujo sistema de magia é o mais completo a poderoso que possuímos. De acordo com esse sistema, o operador, depois de um prolongado período de purificação a preparação, evoca não apenas as forças angélicas, mas também as demoníacas. 3. Muitas pessoas queimaram os dedos com o sistema de Abramelin, e por uma razão muito simples, pois, se examinarmos seus relatos, descobriremos que elas nunca seguiram o sistema por completo, escolhendo uma ceri• mônia aqui a uma invocação acolá, segundo seus humores. Conseqüentemente, o sistema de Abramelin ganhou má reputação por ser uma fórmula singularmente perigosa, ao passo que, executada por completo, é singularmente segura, porque trata de todas as reações das forças evocadas sob o que poderíamos chamar de "condições de laboratório" neutralizando-as, assim. 4. Todo aquele que tenta manipular o aspecto positivo de uma Sephirah precisa lembrar que ela tem também um aspecto negativo, a que, a não ser que ele possa manter o necessário equilíbrio de forças, esse aspecto negativo pode tomar-se dominante a arruinar a operação. Há um ponto em toda operação mágica em que se encontra o aspecto negativo da força e, a não ser que seja enfrentado, ele jogará o experimentador na fossa que abriu. Há uma sábia máxima mágica que aconselha a não evocarmos qualquer força a não ser que estejamos preparados para enfrentar o seu aspecto adverso. S. Ousaríamos, por acaso, evocar a energia ígnea de Marte (Geburah) em nós mesmos, se não nos tivéssemos disciplinado a purificado para podermos impedir a força marciana de chegar aos extremos a induzir à crueldade e à destrutividade? Se temos alguma compreensão da natureza humana, de-

vemos saber que todo indivíduo tem os defeitos de suas qualidades - ou seja, se ele é vigoroso a enérgico, ele está predisposto a incorrer na crueldade e na opressão; se é calmo a magnãnimo, está predisposto às tentações do laissez faire a da inéreia. 6. As Qliphoth recebem corretamente o nome de Sephiroth malignas e adversas, porque não são princípios ou fatores independentes no esquema cósmico, a sim o aspecto desequilibrado a destrutivo das próprias Estações Sagradas. Não existem, na verdade, duas Árvores, mas apenas uma, a uma Qliphah é o reverso de uma moeda cujo lado oposto é uma Sephirah. Todo aquele que utiliza a Árvore como um sistema mágico deve necessariamente conhecer as Esferas das Qliphoth, porque ele não tem outra opção senão enfrentá-las. 7. Só o plano de Atziluth possui um Nome de Poder associado a uma única Sephirah, a ele é o Nome de Deus. Ao arcanjo corresponde o diabo e, ao coro angélico, a corte de demônios; a as Esferas sephiróticas têm suas correspondências nas Moradas Infernais. 8. O estudante deve fazer uma cuidadosa distinção entre o que o ocultista chama de Mal positivo a negativo. Esse é um ponto capital na filosofia esotérica, e a não-compreensão de seu significado conduz a erros práticos posteriores, danificando a vida a obra do iniciado, ou, pelo menos, do ser humano que tenta desenvolver uma quantidade módica de livre escolha a autodomínio. Esse é um ponto pouco compreendido, mas singularmente importante na prática, porque influencia imediatamente nossos pontos de vista, de julgamento a de conduta. 9. O Mal positivo é uma força que se move contra a corrente da evolução; o Mal negativo é simplesmente a oposição de uma inércia que ainda não foi superada, ou de um movimento que ainda não foi neutralizado. 11ustremos essas definições por um exemplo. O conservadorismo natural de uma mente amadurecida é encarado como mau pelo futuro reformador; a iconoclastia natural da juventude é encarada como má pelo administrador que estabeleceu seu sistema. Não obstante, nenhum desses fatores oponentes pode ser dispensado 'se queremos que a sociedade se mantenha num estado saudável; entre esses extremos, obtemos um progresso firme que não desorganiza a sociedade, nem permite arrojá-la na inércia a na decadência. Ambos esses fatores são indispensáveis ao bem-estar social, e a ausência de qualquer um deles conduziria a sociedade à ruína. 10. Não podemos considerá-los, portanto, como um mal social, a não ser que haja um excesso. Deveríamos, por conseguinte, na terminologia da filosofia esotérica, classificar o conservadorismo como um Mal negativo, quando considerado do ponto de vista do reformador, e a iconoclastia como um Mal negativo quando considerada do ponto de vista do conservador. 11.0 Mal positivo é algo completamente diverso. Poderá ele ter a natureza de uma iconoclastia excessiva, que beira à anarquia pura a simples; ou a natureza do conservadorismo excessivo, que se toma um privilégio de classe, interesse petrificado que milita contra o bem comum. Ou pode tomar a forma da corrupção política atual, que destrói a eficiência da máquina administrativa, ou de corrupção social, tal como a prostituição organizada ou a exploração do trabalho de crianças, que mina a saúde do corpó-nacional. 12. 0 impulso conservador e o impulso radical atrairão aqueles que simpatizam com esses pontos de vista, a seus partidários organizar-se-ão rapidamente em partidos políticos; esses partidos não são maus, a não ser aos olhos preconceituosos de seus adversários políticos; o corpo principal da nação contrapõe-se a eles a os suporta imparcialmente, reconhecendo que eles representam fatores complementares. Da mesma forma, os elementos corruptos a criminais da sociedade tenderão a organizar um Tammany Hall próprio. Ora, os partidos Conservador a Radical' poderiam ser associados a Chesed a Geburah, respectivamente. 0 Tammany Hall poderia ser comparado à Qliphah correspondente de Geburah, as forças incendiárias e opositoras; a os reacionários organizados, à Qliphah de Chesed, os engendradores da destruição. 13.0 mal negativo é o corolário prático do princípio do Equilíbrio. 0 equilíbrio é o resultado do equilíbrio das forças opostas; conseqüentemente, elas devem combater-se mutuamente. Não devemos incorrer no erro de classificar uma força de um par de forças oponentes como boa e a outra como má, pois fazê-to é cair na heresia fundamental do dualismo. 14. Os comentadores instruídos a esclarecidos de todas as religiões encaram o dualismo como uma heresia; somente os adeptos ignorantes de uma fé acreditam no conflito entre luz a trevas, espírito a matéria, que resultará eventuahnente no triunfo de Deus a na abolição a eliminação total de todas as influências opostas. 0 Protestantismo esquece que Lúcifer é o Dador-de-Luz, que Satã é um anjo caído, a que o Senhor não limitou Seu ministério à humanidade, mas desceu ao inferno a pregou aos espíritos cativos: Não podemos lidar com o Mal cortando-o a destruindo-o, mas apenas absorvendo-b a colocando-nos em harmonia com ele. 15. Em todos os nossos cálculos a conceitos, devemos fazer uma clara distinção entre a resistência da Sephirah compensadora e a influência da Qliphah correspondente. As duas Árvores, a Divina e a Infernal, a Sephiró-

tica e a Qliphótica, são comumente representadas como apareceriam se a Árvore adversa fosse um reflexo da Árvore Celestial num espelho colocado em sua base, igualando assim, proporcionalmente, a altura da outra. Obteríamos, então, um conceito mais exato se concebêssemos os dois hieróglifos como inscritos em cada lado de uma Esfera, de modo que, se um pêndulo balançasse entre Geburah a Gedulah (Marte a Júpiter), ele atingiria o lado oposto do globo, girando na direção da influência da Sephirah adversa correspondente. Se ele se afastar em demasia de Geburah (Severidade), ele chegará à Esfera das forças incandescentes a destrutivas a do ódio; se ele se afastar na direção da Misericórdia, chegará à Esfera dos engendradores da destruição, a esse nome é muito significativo. 16.0 místico diz-nos que seu objetivo é operar na Esfera do espírito puro sem qualquer combinação com a Terra e, por isso, ele evoca apenas o Nome de Deus; mas o ocultista replica: "Enquanto estiveres num corpo terrestre, és um filho da Terra, a para ti o espírito não pode ser puro. Quando evocas o amor de Deus, este não pode it até ti a não ser por meio de um Redentor. A Esfera do Redentor é Tiphareth a seu arcanjo é Rafael, 0 Curador, pois não reconhecemos a influência do Redentor por meio de sua influência curadora sobre o corpo e a alma? Mas o oposto do Redentor que harmoniza são os Zourmiel, Os Querelantes, "os grandes gigantes negros que combatem sem cessar". Não vemos a sua influência nas doutrinas mais sombrias do Cristianismo, na idéia do castigo eterno sob o domínio do Demônio, contrastado com a recompensa eterna sob o domínio do vingativo a venal Jehovah? Se essas não são Forças Duais Contrárias, o que são? 0 moderno pensamento religioso comete um grande erro ao não compreender que o excesso de um Bem é afinal de contas um excesso. 17. 0 único período durante o qual há perfeito equilíbrio de força é durante um Pralaya, uma Noite dos Deuses. A força em equilíbrio é estática, potencial, jamais dinâmica, porque a força em equilíôrio implica duas forças opostas que se neutralizaram perfeitamente e, assim tomaram-se inertes a inoperantes. Destrua-se o equilíbrio, a as forças serão libertadas para a ação, dando margem à mudança, ao crescimento, à evolução e à organização. Não há possibilidade alguma de progresso no equilíbrio perfeito; é um estado de repouso. Ao final de uma Noite Cósmica, o equilíbrio é destruído e, em cónseqüência, ocorre mais uma vez uma efusão de força, dando origem novamente à evolução. 18.0 equilíbrio do universo poderia ser mais bem comparado antes ao movimento de um pendulo do que à apreensão de uma.tenaz. 0 equilíbrio não é imóvel, a há muita difereXiça entre esses dois conceitos. Pois, no controle, há sempre uma pequena vibração, um tremor entre as forças opos tas que o mantém firme; é uma estabilidade, não da inércia, mas do esforço. 19. Esse aspecto é representado na Árvore pelos dois Pilares da Mise ricórdia a da Severidade, que se opõem mutuamente. Geburah (Severidade; se opõe a Gedulah (Misericórdia). Binah (Forma) se opõe a Chokmah (For ça). Se essa oposição cessasse, o universo entraria em colapso, tal como un homem que está puxando uma corda cai se essa corda se rompe. Devemo; compreender claramente que essa tensão, essa resisténcia contra a qual deve mos nos debater em cada uma de nossas ações, não é má; é o contrapeso ne cessário de toda força que empregamos. 20. Como já observamos num capítulo anterior, cada Qliphah nascei primordialmente como uma emanação da força desequilibrada no curso d< evolução da Sephirah correspondente. Houve um período em que as força: de Kether se expandiram para formar Chokmah, e o Segundo Caminho esta va em vias de existir, sem se ter, porém, totalmente estabelecido; Kelhe~ encontrava-se, portanto, em desequiliôrio - expandido, mas não compen sado. Vemos esse mesmo fenômeno do estado de transição patológica cla ramente ilustrado no caso do adolescente que deixou de ser uma crianç~ sob controle a ainda não se tornou adulta a capaz de controlar-se a si mesma. 21. Foi esse inevitável período de força desequilibrada, a patologia d, transição, que deu origem a cada uma das Qliphoth. Segue-se, portanto que a solução do problema do Mal a sua erradicação do mundo não serãc obtidas por meio de sua supressão, cortando-o ou extirpando-o, mas po meio de sua compensação a conseqüente absorção na Esfera de onde pro veio. A força desequilibrada de Kether, que deu origem às Forças Duai: Compensadoras, precisa ser neutralizada por um aumento correspondente da atividade de Chokmah, a Sabedoria. 22. A força desequilibrada de cada Sephirah, portanto, que surgiu sem controle durante as fases temporárias do desequilíbrio que ocorre perio dicamente no curso da evolução, forma o núcleo em tomo do qual se or ganizaram todas as formas mentais do Mal que surgem na consciéncia do; seres perceptivos ou por meio da operação das forças cegas que se encon travam desequilibradas, buscando cada espécie de desarmonia o lugar que lhe correspondesse. Podemos deduzir então que um mero excesso de força; embora pura a boa em sua natureza intrínseca, pode, quando não-compen sada, tomar-se, no curso das eras, um centro altamente organizado a desen. volvido do Mal positivo a dinâmico. 23. Um novo exemplo nos ajudará a compreender esse ponto. Um excesso da energia necessária de Marte (Geburah), a energia que destrói a inér-

cia a faz desaparecer o excremento e a substância usada, deveria necessariamente ocorrer durante o período que precede a emanaçáo de Tiphareth, o Redentor. Assim que é emanado, o Redentor compensa as severidades de Geburah, assim como disse o Senhor: "Dou-vos uma nova lei. Já não direis: olho por olho, dente por dente (. . .)". Ora, essa severidade unilateral de Geburah deu-nos o ciumento Deus do Velho Testamento a todas as perseguições religiosas que se fizeram em Seu desequilibrado Nome. Ele forma as Qliphah de Geburah, a toda natureza cruel a opressora está sintonizada com essa divindade. Para sua Esfera flui todo excesso de força que emana e que não é absorvido pela força oposta no universo - toda vingança insatisfeita, toda sede de crueldade não-satisfeita, a essas forças, sempre que encontram um canal de expressão aberto, se manifestam por meio dele. Conseqüentemente, o homem que se deixa arrastar pela crueldade descobre cedo que não está expressando os impulsos de sua própria natureza não-desenvolvida ou disforme, mas que uma grande força, tal como uma corrente em jorro, corre por ele, levando-o de um ultraje a outro, até que ele perca fmalmente seu autocontrole a discrição, a destrua a si mesmo por alguma expressão incauta de seus impulsos.

24. Toda vez que nos tomamos um canal de alguma força pura, ou seja, qualquer força que é simples a não-diluída pelos motivos ulteriores e considerações secundárias, descobrimos que há um rio caudaloso atrás de nós - o fluxo das forças Sephiróticas a Qliphóticas correspondentes - que abre um canal, utilizando-nos como seu intermediário. É isso que dá ao fanático ignorante o seu poder anormal.