Este artigo é parte integrante da série A Visão e a Voz - Liber 418

Liber 418: A Visão e a Voz, é considerado por Aleister Crowley como o segundo livro em importância, perdendo apenas para Liber AL vel Legis Para obtê-lo, Aleister Crowley e seu discípulo, o poeta inglês Victor Benjamin Neuburg, viajaram as terras áridas da Argélia e ali realizaram invocações específicas valendo-se do sistema enoquiano de John Dee e Edward Kelley.


LIL é o 1º Æthyr invocado no Liber 418. Refere-se à visão da Criança Coroada e Conquistadora, o Senhor do Æon.

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A invocação do 1º Æthyr chamado LIL

Que haja louvor e veneração e honraria e glorificação e gratificação ao Mui Sagrado que permitiu-nos chegar tão longe mostrando-nos os mistérios inefáveis e que o mesmo possa ocorrer com os homens. E nós suplicamos em nome da Sua infinita bondade, que revele a nós o Mistério do Primeiro Æthyr.


(Aqui segue o Chamado do Æthyr)


O véu do Æthyr parece o véu da noite, azul escuro, repleto de incontáveis estrelas. E pelo véu ser infinito não é visto o globo alado do sol queimando no centro. Sou invadido por uma paz profunda - além do êxtase, além do pensar, além da própria existência em si, IAIDA (esta palavra significa “Eu sou”, mas num sentido completamente além do ser).


(Nota - a soma das letras em hebraico resulta 26. No alfabeto hebraico as letras do nome do Æthyr somam 70, ayin; porém pela atribuição Yetziratica das letras em hebraico resulta 66 que, por sua vez, é a soma dos números de 0 a 11).


Sim; há paz. Não existe tendência de qualquer tipo muito menos qualquer sinal de sensação ou impressão. Existe apenas uma débil consciência como o perfume de jasmim.


O corpo do Vidente repousa num sono desperto mais profundo do que o tradicional e sua mente está quieta como um lago no deserto coberto por plácidas palmas.


Anoitece e, pela noite ser toda aquela do espaço e não a incompleta da noite terrestre, não existe sinal de aurora. Pois a luz do Sol cria ilusão e cegando os homens à glória das estrelas. E a menos que estejam na sombra da terra, não poderão ver as estrelas. Do mesmo modo, se ele não estiver escondido da luz da vida, não poderá contemplar Nuit. Aqui então, irei permanecer nesta imutável meia-noite em profunda paz.


Esqueci onde estou e quem sou. Estou suspenso no nada.


Agora o véu se abre. (Para o Escriba: aproxime-se, não quero falar assim tão alto)


Surge uma pequena criança coberta com lírios e rosas. Está sendo amparada por uma incontável miríade de Arcanjos. Os Arcanjos possuem todos o mesmo brilho incolor além de serem todos cegos. Abaixo deles estão muitas, mas muitas outras legiões são tantas que os olhos não conseguem acompanhar. E em sua fronte, em seu coração e em sua mão está o secreto sigilo da Besta (866). E a glória disso tudo é tão grande que todos os meus sentidos espirituais falham bem como seus reflexos no corpo.


É muito estranho. O meu coração está em êxtase, sagrado e inefável, absolutamente além da emoção; além daquela felicidade chamada Ananda, infinitamente calma e pura. Ainda nos portais de meus olhos pairam lágrimas como sentinelas que, inclinados em suas lanças, ouvem.


O grande e terrível Anjo fixa seu olhar em mim, como se quisesse obstruir-me da visão. Minha mente nubla-se. Existe outro me forçando ao sono.


(É muito difícil falar sobre isso, pois uma impressão leva um tempo enorme para ir da vontade aos músculos. E, naturalmente, não tenho noção do tempo)


Fui levado novamente em direção a criança por dois Anjos, abaixando minha cabeça.


Esta criança parece aquela que tentaram descrever no “Jardim de Janus”.


Cada volição é inibida. Eu tentei dizer muito, mas tudo se perdia pelo caminho.


Sagrado és tu, Ó mais belo do que as estrelas da Noite!


Nunca houve tal paz, tal silêncio. Mas essas são coisas positivas. Cânticos de louvores às coisas eternas entre as chamas da primeira glória e cada nota de cada canção é uma nova flor no buquê da paz.


A criança dança não, pois ela é a alma de dois bailados - a mão direita e a mão esquerda e nele ambas são um bailado, o bailado sem movimento.


Há orvalho espalhado por todo o fogo. Cada gota é a quintessência do êxtase das estrelas.


Pela terceira vez sou levado a ele, prostrando-me sete vezes a cada passo. Há um perfume no ar que se reflete em todo o corpo do vidente. Esse perfume estimula seu corpo com um êxtase parecido com amor, com o sono.


E esta é a canção:


Eu sou o filho de tudo que é o pai de tudo, pois de mim veio tudo o que eu posso ser. Eu sou a fonte nas neves e sou o mar eterno. Eu sou o amante e sou o amado e sou os primeiros frutos do amor deles. Eu sou primeiro débil tremor da Luz e eu sou a roca onde a noite tece o seu impenetrável véu.


Eu sou o capitão das hostes da eternidade, dos espadachins e dos lanceiros e dos arqueiros e dos aurigas. Eu liderei as forças do leste contra as forças do oeste e as forças do oeste contra as forças do leste. Porque eu sou Paz.


Meus bosques de oliva foram plantados por uma prostituta e meus cavalos treinados por um ladrão. Minhas vinhas cresceram em volta das lanças do Altíssimo e com a minha risada eu matei milhares de homens.


Com o vinho em minha taça eu misturei os relâmpagos e moldei meu pão com uma espada afiada.


Com o meu desatino eu desfiz a sabedoria do Magus e com as minhas decisões eu subjuguei o universo. Eu devorei a romã na Casa da Ira e espremi o sangue de minha mãe entre moedores para fazer o pão.


Não há nada que eu não tenha pisado. Não há nada que eu não tenha adornado na minha fronte. Como uma faixa eu cingi todas as cousas em minha cintura. Eu escondi todas elas na caverna do meu coração. Eu matei todas as cousas porque eu sou Inocência. Eu deitei com todas as cousas porque eu sou a Virgindade Intocada. Eu dei a luz a todas as cousas, pois eu sou a Morte.


Imaculados estão meus lábios, pois são mais vermelhos do que o vinho e o sangue com o qual me intoxicaram.


Imaculada está minha testa, pois ela é mais clara do que o vento e o orvalho que ele refresca.


Eu sou luz e sou noite e eu sou aquilo além deles.


Eu sou a fala e eu sou o silêncio e eu aquilo além deles.


Eu sou vida e eu sou morte e eu sou aquilo além deles.


Eu sou guerra e eu sou paz e eu sou aquilo que está além deles.


Eu sou a fraqueza e eu sou a força e eu sou aquilo que está além deles.


Assim por nenhum deles pode o homem chegar a mim. Assim por cada um deles deve o homem chegar a mim.


Tu rirás da estupidez do tolo. Tu aprenderás a sabedoria do Sábio. E tu serás iniciado nas cousas sagradas. E tu serás ensinado nas cousas do amor. E tu serás poderoso nas cousas da Guerra. E tu serás mestre nas cousas do oculto. E tu decifrarás os oráculos. E tu levarás todas essas cousas em teu carro e por uma dessas não poderás chegar a mim ainda que por uma delas deves tu chegar a mim. E tu deverás ter a força do leão e os segredos do eremita. E tu deverás girar a roda da vida. E tu deverás segurar a balança da Verdade. Tu passarás através das grandes Águas, um Redentor. Tu deverás ter a cauda do escorpião e as flechas venenosas do Arqueiro e os terríveis chifres do Bode. E tu derrubarás a fortaleza que guarda o Palácio do Rei, meu filho. E tu obrarás pela luz da Estrela e da Lua e do Sol e pela terrível luz do julgamento, o nascimento do Espírito Santo em ti. Quando esses tiverem destruído o universo então poderás tu adentrar o palácio da Rainha, minha filha.


Bendito, bendito, bendito; sim, bendito três e quatro vezes bendito é aquele que conseguiu olhar tua face. Eu tirarei você da minha presença como um raio rodopiante para guardar os caminhos e a quem tu golpeares será realmente ferido. E a quem tu amas será amado de fato. E se pelo golpe ou pelo amor tu trabalhas cada um verá minha face, um vislumbre através de mil véus. E eles erguer-se-ão do sono do amor ou da morte e cingir-se-ão com uma cinta feita da pele da cobra em nome da sabedoria e eles usarão túnicas de pureza e o avental da cor laranja flamejante pela vontade e sobre seus ombros eles jogarão a pela da pantera de coragem. E eles usarão a nêmis do segredo e o ateph coroa de verdade. E em seus pés calçarão sandálias feitas de pele de peitos, deixai-os pisarem em tudo que foram e que a própria resistência ajude-os e proteja seus pés à medida que passam pelo místico caminho que passa através dos pilares. E sobre seus peitos estar a Rosa e a Cruz da luz e da vida e em suas mãos a lâmpada e o cajado do eremita. Assim deverão eles partir para a infinita jornada onde cada passo é uma indizível recompensa.


Sagrado, Sagrado, Sagrado, Sagrado, sim, três e quatro vezes és tu, pois conseguis-te olhar minha face; não apenas pela minha graça, não apenas por tua magia, possa ser isso alcançado.


Poderoso, poderoso, poderoso, poderoso, sim, três e quatro vezes poderoso és tu. Aquele que se erguer contra ti deverá ser derrubado, embora tu não ergas um dedo sequer contra ele. E aquele que te caluniou será jogado à vergonha embora teus lábios não pronunciem uma sílaba sequer contra ele. E aquele que pensou mal de ti terás os pensamentos confusos embora em tua mente não seja criado pensamento algum em relação a ele. E eles deverão ser trazidos ao teu julgo para servi-te embora tu não queiras isso. E essas cousas serão para eles graça e sacramento e juntos deverão sentar no banquete superno e vós festejareis com o mel dos deuses e se embriagarão com o orvalho da imortalidade - POIS EU SOU HÓRUS, A CRIANÇA COROADA E CONQUISTADORA QUE TU NÃO CONHECIAS!


Avançai, portanto, Ó tu Profeta dos Deuses, em direção ao Altar Cúbico do Universo; lá tu deverás receber cada tribo e reino e nação na poderosa Ordem que chegou da fortaleza fronteiriça que vigia o Extremo Abismo até o Meu Trono.


Esta é a formula do Æon com a voz de LIL que é a Lâmpada de Luz Invisível, está encerrada. Amem.



Biskra, Argélia
19 de Dezembro de 1909 - 13:30 - 15:30.

Referências